25.6.07

DIÁRIO DE UM VELHO LOUCO 谷崎 潤一郎


Junichirô Tanizaki (1886-1965)
Estação Liberdade
Tradução de Leiko Gotoda 208 p. 14 x 21 cm ISBN: 85-7448-059-2


Utsugi é um velho de 77 anos que vai relatando seu quotidiano, à primeira vista, morno, num diário, como indica o nome do romance. Temos, então, acesso à rotina dos remédios, hospital, médico, família, dores. Mas, Utsugi é um velho que, confrontado com as doenças e a idade, decide que não tem nada a perder. E pessoas que não têm nada a perder podem ser muito interessantes. Assim é este romance, o último de Tanizaki, escrito já nos anos 60. O autor estava também na casa dos setenta e sabia bem do que falava. O tema não é novo na obra de Junichiro Tanizaki, fetichismo, masoquismo, mulheres encantadoras prontas para se aproveitarem da fraqueza de um homem. No caso desta obra, a mulher em questão é a nora de Utsugi, Satsuko que vive na mesma casa e é odiada pelas cunhadas, o narrador se compraz com os desentendimentos e toma, claro, sempre o partido da nora. Mas podemos mesmo afirmar que Satsuko é uma aproveitadora sem correr o risco de cair na armadilha do moralismo? Nem o autor, nem o narrador são moralistas, em momento algum. Não encontramos aqui nem moralidade, nem imoralidade, como a maior parte da obra de Tanizaki, este diário pode ser considerado amoral. E por outro lado, quem estaria manipulando quem? O velho Utsugi deixa claro que, apesar de velho e impotente, ainda sente desejo. Escreve em seu diário:


“Penso, antes, que o fenómeno tem a ver com a sexualidade de um velho impotente — pois alguma sexualidade existe, mesmo num velho impotente.”

Ou ainda:

"Não tenho nenhuma intenção de me apegar tenazmente à vida, mas uma vez que continuo vivo, não posso deixar de sentir atração pelo sexo oposto.”

É bem verdade que Satsuko aceita os presentes do sogro, jóias caras, por exemplo e permite que o velho a espie durante o banho, que toque o seu pé, esta parte do corpo tão importante na obra de Tanizaki:

“Percorro com os lábios desde a panturrilha até o calcanhar. Para minha surpresa, ela não reclama. Me deixa agir à vontade. Minha língua explora o dorso do pé e alcança a ponta do dedão. Ponho-me de joelhos, pego o pé nas mãos, ergo-o e encho a boca com o dedão e os dois dedos seguintes. Pressiono os lábios contra o arco plantar.”

Essa é uma parte do jogo entre os dois personagens principais e não cabe aqui nenhum julgamento. O velho se alegra com as migalhas que a vida ainda pode olhe oferecer. É tudo. E porque se dar o trabalho de manter um diário? Em parte pelo prazer de escrever. Ele explica:

“Mantenho um diário porque gosto de escrever. Não pretendo mostrá-lo a ninguém. A vista anda espantosamente fraca, não consigo ler quanto gostaria e, como não tenho outras distrações, estou sempre disposto a escrever para passar o tempo. Uso pincel grosso e escrevo graúdo para facilitar a leitura. Guardo o diário num cofre pequeno, não quero que ninguém o leia. Já lotei cinco desses cofres. Imagino que será melhor queimar os manuscritos algum dia, mas me agrada também a idéia de deixá-los para a posteridade.”

As histórias de Tanizaki são sempre muito tem consctruídas, é possível ler o autor somente por sua narrativa, mas o mais fascinante ainda é o seu texto, a sua forma de escrever, de discorrer sobre a existência, a sexualidade,a velhice sem nunca condescender. A vida como ela é, mas mostrada em elegantes linhas.

A edição da Estação Liberdade foi traduzida por Leiko Gotoda, sobrinha de Tanizaki.


Leila M. Silva

3 comments:

Sara F. Costa said...

Nunca li nada do autor, vou encomendar algumas coisas mas realmente parece muito aliciante ^_^

Anonymous said...

um barato! vc ampliando horizontes. meu filho Lucas estuda japonês e adora tudo que é de lá.
bjs laura

Jutilde de Medeiros said...

Outro dia entrei em um sebo e encontrei "O Diário de um velho louco", mas que frustração, o vendedor não conseguiu encontrar o livro na prateleira, apesar de ter tantos japoneses em São Paulo, não é tão fácil encontrar autores japoneses traduzidos.