Se alguma vez se perguntou qual era o samurai mais emblemático do Japão, Eiji Yoshikawa (吉川 英治,) publicadou originalmente em pequenos capítulos diários no jornal Asahi Shimbum, entre 1935 e 1939, aquilo que seria a mais bela homenagem ao guerreiro mais apreciado da Historia do Japão: Miyamoto Musashi.
A obra epónima “Musashi” encontra-se dividida em vários “livros” incluindo:
Livro 1. A Terra, Livro 2. A Agua, Livro 3. O Fogo, Livro 4. O Vento, Livro 5. O Céu, Livro 6. Sol e Lua, Livro 7. A luz perfeita.
Essa divisão é a dita original, sendo que em função da editora é possível encontrar a obra completa num só livro, dividida em dois: “A pedra e o sabre” e a “luz perfeita”, ou com a divisão original.
O género da obra é o reflexo da personalidade da personagem que narra, um condensado de lutas de espada com reflexões filosóficas, o retrato do percurso que leva os grandes para a glória que lhes era predestinada, pela essência do génio que dormia neles. Musashi é um percurso iniciático, o caminhar de uma reflexão sobre a excelência e a autodeterminação, um condensado do espírito marcial japonês aliado ao ritmo de uma história movimentada pela sua dimensão épica.
A história começa no fim da batalha de Sekigahara 関ヶ原の戦い que vê nascer para o Japão uma era de unificação sob o reino dos Tokugawa. Mas para Takezo Shinemen e Matahachi Hon’iden o momento é grave, fazendo eles parte das tropas de Hideyoshi, é deitado no chão fingindo a morte, que os dois esperam pacientemente pela partida dos soldados inimigos. Recolhidos por duas mulheres cuja principal ocupação é a pilhagem de cadáveres, os dois jovens da aldeia de Miyamoto são mutualmente o espelho um do outro. Quando Matahachi decide abandonar a vida que lhe era predestinada em Miyamoto para ficar nos braços da ladra Oko desleixando a sua promessa de casamento com a doce Otsu. Takezo decide continuar por si própria o seu caminho, o tigre japonês persegue o caminho que o seu corpo de gigante lhe predestinou voltando para a sua aldeia, deixa por traz o seu amigo cujos horizontes se revelam mais obscuros pela triviliadade e fraqueza da sua escolha.
Porém, Takezo é ainda imaturo e arrogante. A sua prodigiosa força física não lhe permite abrir-se ao caminho da reflexão. Voltando por si próprio para a aldeia, é condenado como um desertor e o responsável pelo desparecimento de Matahachi, torturado Takezo é obrigado a comprometer-se com si próprio e a sua condição e, libertando-se, o animal selvagem se compromete a seguir a via do guerreiro, aquela que dará sentido às suas garras e que o fará esquecer o seu nome para renascer com o nome de Miyamoto Musashi, uma alma imatura que se forja a cada passo no equilíbrio perfeito entre sabedoria e arte da espada.
O relato da história é em grande parte fictícia mas a essência da evolução da personagem é claramente fiel à história original. O autor dos “cincos anéis” ganha a densidade psicológica que a historia não lhe preservou, demonstrando ao longo da obra os altos e baixos de um processo de raciocínio em que cada viagem e aventura leva a uma nova conclusão sobre o ideal da Via da Espada. O leitor encontra-se na mesma posição, é com febrilidade que as peripécias do herói nos levam a contemplar a magnificência dos combates digno de cativar qualquer amador de mangas shonen, a reflexão filosófica que alimenta a nossa sede de saber, e acima de tudo a contemplação da construção da mente de uma personagem que ganha sabedoria conhecendo-se melhor a si própria despertando pela reflexão a nobreza de alma que já residia no seu intelecto.
A obra ainda possui um forte carácter sentimental, sendo que a história de amor do Musashi ganha em intensidade e dramatismo ao longo da obra.
O que mais sobressai da obra é a sua acessibilidade. Com efeito, por experiência própria, o livro consegue reconciliar com imensa facilidade qualquer jovem leitor com a literatura. Aqui a evolução da personagem imatura leva a um processo de auto identificação forte, em que a relfexão nunca se torna asfixiante pela importância dada à estratégia dos combates e à imprevisibilidade das peripécias da história. Nesse aspecto a obra poderia comparar-se aos três mosqueteiros ou aos romances dos cavaleiros do Rei Artur. Atrevo-me até a considerá-lo como a obra mais “mangaesca” da literatura, tudo na evolução da história parece respeitar os códigos do típico shonen, com a sua personagem imatura com potencial que se torna ao longo da história mais forte e mais matura.
A obra na minha opinião revela-se simplesmente imprescindível para qualquer amante do espírito do bushido.
Matthieu Rego
10 comments:
Obrigada pelo artigo, estava esperando-o com ansiedade...
valeu...
Musashi com certeza será meu livro de cabeceira.
bungaku? Em malaio isso significa "minha flor"...
Como a vida não é só política e o Oriente não é só o Japão, e eu procuro manter-me informado de outras coisas de Timor, fiquei muito contente por descobrir que já há cinema timorense. Pelo menos um filme.
O JP Esperança pôs o filme no blog dele. Podem ir lá ver.
http://jpesperanca.blogspot.com/2008/03/sirana-o-incio-do-cinema-timorense.html
Para a Annabel Lee:
Pela leitura do meu blogue, arigatou gozaimashita! Este vosso tb está mto interessante. Vou passar aki de vez em quando!
Sem dúvida um livro fantastico e muito inspirador do ponto de vista do manga!
Eiji Yoshikawa morreu em 1962, de modo que não há como ele ter publicado o livro em 1981, como mencionado no texto.
A história foi publicada originalmente em formato de folhetim no Japão em 1935, posteriormente sendo compilada em livro.
1981 é a data da publicação da tradução em inglês da obra, feita por Charles S. Terry.
Não tendo estudado a questão de forma pormenorizada (as datas de publicações não sendo a minha especialidade) confesso ter sido enganado por falsas informações relativamente ao sujeito acreditando na sua rectificação, tinha apenas consciência da publicação jornalística que omiti voluntariamente para não tornar o artigo demasiado denso em factores desnecessários.
O artigo será com certeza alterado com os dados correctos.
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